O dever do médico é lutar e não garantir: quando a medicina fracassa, nem sempre a culpa é de quem lutou
@alemdadefesamedica


Na cultura popular, é comum ver o médico ser enaltecido como herói quando um tratamento dá certo, mas rapidamente apontado como vilão quando o desfecho é adverso.
Essa percepção distorcida revela um problema mais profundo: a expectativa equivocada de que o médico deve entregar resultados garantidos. Como se a cura fosse uma obrigação, e não uma possibilidade. Como se, diante de uma perda, houvesse sempre um culpado.
Mas a medicina nunca foi ciência de resultados. É, essencialmente, uma ciência de meios. O médico tem o dever de empregar todos os recursos técnicos, científicos e éticos disponíveis. O compromisso dele é com a diligência, não com a cura.
É injusto e perigoso, esperar da medicina o que ela não pode prometer. O sucesso terapêutico depende de múltiplos fatores, muitos dos quais fogem ao controle do médico:
• A resposta biológica do paciente;
• O momento em que se buscou o atendimento;
• As limitações estruturais do sistema de saúde;
• A conduta de outros profissionais ao longo da jornada do cuidado.
Ignorar essa complexidade é reduzir a medicina a um ato isolado, desconectado de contexto, e o médico a um prestador de resultados, não de cuidado.
Quando tudo dá certo, o médico “não fez mais que a obrigação”. Mas quando o desfecho é desfavorável, ainda que inevitável, ele é alvo de frustração, julgamento e responsabilização precoce.
Isso impõe uma pressão desumana sobre quem, na maioria das vezes, lutou com todas as armas possíveis contra o desfecho.
É preciso educar a sociedade: a medicina não é mágica, e o médico não é milagreiro.
Culpabilizar o profissional por todo e qualquer resultado negativo é não só injusto, como contraproducente, pois alimenta uma medicina defensiva, burocrática, e cada vez mais distante da verdadeira essência do cuidado.
A valorização da medicina começa por entender seus limites.
E respeitar o médico é, antes de tudo, respeitar a própria natureza da prática médica.